Todos os anos eu volto em Agosto ao mesmo
lugar, isto é, vindo pelo Sul entro na rãs, viro à esquerda, passo pela Relva e
desço lentamente aquela estrada
que outrora era caminho que
tantas vezes palmilhei, e que me leva ao Senhor dos Caminhos.
Observo, qual
paisagem imutável, os mesmos pinheiros, os mesmos penedos, desde a idade em que
com a minha bata branca e a minha faixa de cruzado, talvez desse uma nota de
candura à procissão dos Domingos
de Lazaro.
Depois de dar uma
volta ao Santuário, desço até à margem esquerda do Vouga, imobilizo-me no lugar
onde outrora construía as minhas casinhas, observo com certa nostalgia aquele
rectângulo verde seco, onde passei grande parte da minha adolescência, ora
guardando a “castanha” e a “amarela” d Setembro a Janeiro, ora apanhando o feno
sob o tórrido calor de Julho.
Tento atravessar o
rio onde atravessei centenas de vezes para ir buscar agua fresca a uma nascente
situada numa propriedade, pertença de alguém de Vila Boa; ( obrigado pela
agua). Ai, um no aperta-me a garganta: Que é da agua cristalina onde antigamente até lavávamos a loiça?
Que é das libelinhas azuis que com os seus voos acrobáticos me faziam esquecer
a arduidade do trabalho?
Hoje abundam as algas e falta a agua. Até os
peixes desertaram. Desço até à levada do Trabulo, e ai ponho-me a sonhar: Não seria possível
construir ai uma mini barragem que evitaria as inundações no Inverno, e constituiria uma reserva para o
combate aos incêndios do Verão? E quem sabe se os aviões tipo Canadair lá
poderiam abastecer?!
Regresso e sento-me
frente à Igreja; imagino já a agua
visível do adro a partir do qual se poderia abrir uma estrada directa ao rio. Quem
sabe se até o Senhor dos Caminhos apreciaria! Viriam os peregrinos e os
turistas; os peregrinos poderiam tomar banho, e os turistas poderiam rezar e
deste modo o Verão seria uma festa naquele local sagrado!
Um tanto ou quanto
extenuado, retiro-me para a sombra da carvalha. Recordo os duros trabalhos
efectuados durante tantos anos nas imediações da igreja, compensados com as
merendas dos dias de festa: o bom cabrito assado e o bom vinho tinto. Se o
Senhor dos Caminhos o permitir, para o ano cá estaremos de novo.
António S. Leitão.